17/04/2024

Crítica do filme: 'Minha Vida Perfeita'


Das ameaças às decisões. Chegou esse mês, e sem muito alarde, ao catálogo da Netflix, um longa-metragem polonês que exercita o caos emocional e como o destino pode dar um empurrãozinho nas mudanças necessárias de uma vida. Escrito e dirigido pelo cineasta e ex-tenista Lukasz Grzegorzek, Uma Vida Perfeita dribla o suspense de uma ameaça e embarca em um profundo vazio existencial pelos olhos de uma protagonista, refém de suas próprias escolhas.

Na trama, conhecemos Jo (Ágata Buzek), uma professora do ensino médio com uma vida agitada. Uma mulher que aparenta uma infelicidade constante, vivendo seus dias num conturbado cotidiano, numa casa onde mora com o marido, a mãe, o filho mais velho que acabou de ser pai e o filho mais novo. Ainda por cima, em forma de oásis ao caos que impera em sua frente, tem um relacionamento secreto com outro professor. Um dia, começa a receber ameaças de um alguém que descobriu sua traição.

Com tantas variáveis colocadas no roteiro, busca-se o ritmo através de demonstrações do dia a dia de sua forte protagonista interpretada de forma competente por Ágata Buzek. Uma mulher de meia idade no epicentro de seus dramas é o pontapé inicial dessa história. Os conflitos emocionais se mostram presentes, se amontoam, as derrapadas do não saber lidar viram variáveis constantes por aqui. A narrativa se atropela em alguns momentos, define-se como duas etapas, o antes e depois de um despertar. Isso pode soar bastante confuso e até mesmo uma falta de direção ao discurso previamente proposto.

Como dito, o foco é total em Jo, seu relacionamento em crise com o marido, a falta que sente da liberdade de momentos em que flerta com a felicidade, a confusão organizada que virou sua vida sofre um enorme abalo com a descoberta de sua traição. Nesse último ponto, o filme começa a ganhar força e conseguimos entender melhor essa conflituosa personagem que parece sufocada em suas escolhas do passado, não sabendo como se desprender da estrutura familiar que ajudou a modelar.

Uma Vida Perfeita mostra que do desespero pode surgir uma oportunidade. O exercício pés no chão dentro de um vazio existencial nem pensa em adentrar num suspense, o foco aqui é o psicológico, o drama de uma mulher que desperta após ser colocada contra parede. Não deixa de ser uma jornada que encosta em reflexões de muitas realidades.


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Crítica do filme: 'A Natureza do Amor'


Exibido na Mostra Um Certo Olhar no Festival de Cannes do ano passado, A Natureza do Amor estrutura suas bases partindo do pessimismo em relação ao sentimento mais intenso que existe. O choque dos momentos de êxtase com a realidade, no sentido de conexões que logo viram desconexões, passam por citações de Platão à Schopenhauer. Acompanhamos os desenrolares através de uma protagonista e sua necessidade de descobrir o afeto, o amor, tendo o desejo como uma lacuna que aos poucos vai mudando de sentido. Escrito e dirigido por Monia Chokri, A Natureza do Amor é uma jornada de opostos que se atraem

Na trama, conhecemos a professora Sofia (Magalie Lépine Blondeau), uma mulher inteligente, na casa dos 40 anos, que está em um relacionamento frio com o namorado Xavier (Francis-William Réaume). Certo dia, conhece o atraente Sylvian (Cardeal Pierre-Yves), responsável pela reforma de sua casa de campo. Mesmo sendo completamente diferentes, logo uma paixão intensa acontece entre os dois mas aos poucos a protagonista embarca em dolorosas incertezas.

Falar sobre decepções amorosas passa muito mais pelos personagens do que pelas situações. É bem curiosa a visão pessimista que é proposta. Algo que é válido, pois encosta na realidade. E se incomodar alguns, é porque fez sentido! O roteiro é bem profundo ao jogar para reflexões as dores de uma confusa protagonista, que movimenta para cima o sarrafo encontrando um mar de desequilíbrio, um deserto de desilusões. O prazer e o conviver logo se tornam embates, um jogo da vida que escancara medos e desejos.

Nessa produção canadense francesa também tem um debate interessante entre a frustração e o recomeçar. Dois pontos fora da curva se juntam, trazendo para debates os conflitos familiares, as formas de pensar, rumando para uma constatação da maturidade em relação aos  sentimentos e os conflitos do amar. O recomeçar na verdade se constata como uma estrada de aprendizado, no eterno viver e aprender. A busca pela equilíbrio da ilusória felicidade plena se desprende de qualquer conto de fadas.

A Natureza do Amor é um filme antes de mais nada, maduro. Escancara as verdades longes de melancolias, mostra a realidade. Nem sempre é o tempo certo quando se encontra alguém que preenche parte do que necessitamos e nem por isso é para se baixar a cabeça e estabilizar-se. Sofia é um reflexo de muitas jornadas por aí.


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16/04/2024

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Crítica do filme: 'Hoje é o Primeiro Dia do resto da sua vida'


Um filme sobre pais e filhos sempre traz reflexões e emoções para todos nós que acreditamos em dias melhores para toda uma nova geração. Selecionado para o Festival ‘É Tudo Verdade’ 2024, o documentário paulista Hoje é o Primeiro Dia do resto da sua vida nos leva ao encontro com uma família que está crescendo, com uma adoção aguardada e as iminentes mudanças em torno de suas vidas. Filmado na própria casa de um casal com o lado profissional ligado ao audiovisual, momentos se tornam eternos nesse registro pulsante que coloca a maternidade e paternidade lado a lado.

Mostrando a parte final do processo de adoção de Gael, de apenas 4 meses pelos seus novos pais, os cineastas Bel Bechara e Sandro Serpa, em meio aos tempos complexos de pandemia, de forma leve, verdadeira e emocionante conhecemos as conflitantes emoções que se jogam no caminho, além de descobertas que valerão para toda uma vida. As inseguranças de pais de primeira viagem, as reviravoltas no cotidiano do casal, as novas maneiras de enxergar o mundo, o medo do futuro, se juntam ao abstrato das emoções aqui se ligando a uma ternura que emociona.

Recortes de momentos que outros pais de primeira viagem já tiveram, aproximam essa história com a de tantas outras. É muito fácil se emocionar quando a verdade está presente em cada cena, em cada preocupação. Um mundo que era de dois, agora é de três e o alicerce desse projeto é exatamente mostrar essas mudanças cotidianas que vão desde a arrumação da casa até as primeiras experiências com tudo que uma nova vida precisa. O caos político de uma eleição próxima a vir (o projeto foi filmado em 2021) abre incertezas, medos, caso não haja mudanças.

Hoje é o Primeiro Dia do resto da sua vida é um singelo recorte de uma nova família, uma nova estrutura que é voltada ao amor. Tomara que esse filme chegue até o circuito exibidor. Merece.

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Crítica do filme: 'Luiz Melodia – No Coração do Brasil'


Um observador do próprio cotidiano sem deixar de ampliar os olhares para o coletivo. Escolhido como filme de encerramento do 'Festival É Tudo Verdade' 2024, Luiz Melodia - No Coração do Brasil nos leva para um tour objetivo sobre a carreira gloriosa, com altos e baixos, de um dos maiores artistas que o Brasil já viu. Chegando até o sucesso e o inusitado de ir ao seu desencontro, ao longo de 85 minutos de projeção, pelas ruas da alegria e com o violão debaixo do braço, acompanhamos um meteoro de carisma e genialidade que saiu do morro e conquistou plateias de todo o país.

Com o auxílio do próprio protagonista contando sua história através de imagens e vídeos, o documentário passa pelo toque de sonhar sozinho que levou o grande melodia a uma direção de sucesso atrás de sucesso. Sem fronteiras quanto ao gosto musical, seus embates com o próprio mercado fonográfico, a primeira canetada de sucesso, as parcerias musicais, são algumas das passagens desse belo trabalho assinado por Alessandra Dorgan.

Passando rapidamente por seus primeiros passos na música, sua relação carinhosa e muito próxima com o lugar onde foi criado, o Morro Do Estácio, a chegada ao mundo da fama, num primeiro momento logo reconhecido como talentoso compositor, depois seu desabrochar como um intérprete de apresentações únicas, vemos ao longo de 85 minutos a caminhada até seu brilhantismo que conquistou a atenção de Gal Costa e outras lendas da Música Brasileira.

Com o rico auxílio de imagens de outrora, passeando no estácio, um lugar que sempre lhe quis, ou num momento pelos palcos da vida, Luiz Melodia - No Coração do Brasil costura, num recorte interessante sobre sua carreira, o homem e o artista de forma empolgante. Melodia pode ter ido por aí mas jamais saiu daqui...dos nossos corações.

 

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Pausa para uma Série: 'Fallout'


Tava procurando uma série que me deixasse empolgado e que se tornaria uma brilhante jornada de reflexões. Encontrei! Ambientada no universo de um jogo famoso criado nos anos 90, chegou na Prime Video um seriado empolgante que busca reflexões quando a tragédia flerta com a oportunidade. Nos longos e excelentes oito episódios dessa primeira temporada, em Fallout, somos guiados por carismáticos personagens que embarcam em uma trajetória de absurdos que os levam ao encontro de verdades não ditas e suas as interpretações da moral, dos valores ligados a um princípio darwiniano. Nesse enorme tabuleiro de mentiras, a narrativa brilha ao mostrar as inversões de perspectivas que nos ajudam a entender melhor esse universo fascinante que merece toda nossa atenção.

Na trama, bem à frente no futuro, conhecemos a Terra dizimada por ações nucleares. Para proteger alguns, os Estados Unidos junto à um grupo de empresas, principalmente uma, a Vault- Tec , resolvem criar refúgios subterrâneos. Assim, 200 anos depois do caos começar, conhecemos a jovem Lucy (Ella Purnell) que após o lugar onde nasceu e foi criada ser atacado, e ainda com o sequestro de seu pai, resolve ir atrás dele e desbravar a superfície, um lugar onde nunca antes havia ido. A cada caminhada, uma nova descoberta, e assim seu destino se cruza com Maximus (Aaron Moten), um sobrevivente de um dos ataques nucleares mais impactantes e o enigmático necrótico Cooper (Walton Goggins), esse último com um passado com vivas memórias do início do fim.

O que é preciso fazer para sobreviver? Os protagonistas se misturam na própria angústia, cada um no seu objetivo, em modos diferente de viver, de se adaptar. Saindo de um universo de regras tendo a meritocracia como pilar, com um mundo lá fora com outras, seguimos na maior parte do tempo os olhares de Lucy e sua busca incessante que geram perguntas do tipo: Como melhorar um mundo perdido? Essa ótima personagem passa por uma desconstrução absurda com o medo que logo vira coragem passando pelas dificuldades do confiar.

Não podemos esquecer da jornada de Maximus e Cooper. O primeiro, um jovem traumatizado com seu passado devastador, que é adotado por um grupo militar e almeja dias mais tranquilos num universo onde o poder é tomado, não dado. O segundo, um homem com ações moralmente questionáveis, detentor de muitas memórias dos tempos onde o mundo vivia como os dias de hoje, sobreviventes na superfície dos males da radioatividade, que viu a construção de um império do mal e luta para tentar se encontrar novamente com sua família.

O tempo e a manipulação de tudo. A variável ‘Tempo’ aparece como elemento principal, um catalisador de ações e inconsequências em meio a uma terceirização da sobrevivência. Animais radioativos, clérigos em busca de poder, necróticos que vagam como nômades se juntam à ambição e ao princípio de querer ser Deus, esse último ponto personificado na linha de comando da empresa Vault-Tec. Aliás, as poucas descobertas sobre as criações dessa empresa, e as maiores explicações sobre o potencial de ganhos com o fim do mundo, é o ótimo gancho para uma possível (e provável) segunda temporada.

Fallout já tem toda sua primeira temporada disponível na Prime Video e já posso dizer, é a melhor série do ano até aqui! Brilhante!


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Crítica do filme: 'Grandes Hits'


E se você pudesse voltar no tempo para momentos chaves de seu relacionamento com um alguém que já se foi? Seguindo a lógica de Efeito Borboleta, só trocando as palavras pelas canções, o longa-metragem Grandes Hits apresenta suas reflexões sobre alguns campos da existência raspando a panela da melancolia através de viagens no tempo e batendo forte na tecla do luto. Escrito e dirigido pelo cineasta Ned Benson, a causa e o efeito por aqui se encaixam em uma narrativa que busca abordar temas complexos com maturidade mesmo esquecendo de ligar alguns pontos. Confuso? Um pouco, mas nada que atrapalhe a compreensão do que assistimos.

Na trama, conhecemos Harriet (Lucy Boynton), uma jovem que vive seu presente em constante sofrimento desde que perdeu seu namorado Max (David Corenswet) em um terrível acidente de trânsito anos atrás. Paralisando sua vida por completo, prolongando a dor e o luto, certo dia percebe que consegue viajar ao passado através de algumas músicas que escutou quando estava na presença de Max. Embarcando em uma jornada para tentar mudar o fato mais traumático de sua vida, um dia acaba conhecendo David (Justin H.Min) que a deixará confusa sobre tudo que havia pensando sobre sua maneira de viver.

O luto é um elemento que percorre a trajetória da protagonista. A culpa se junta, quando entendemos os conflitos emocionais que se estabelecem no seu presente e a necessidade de explicações para o que houve no passado. Amargura e as loucuras de inusitadas viagens no tempo através de canções são pontos paralisadores. A premissa corre pela mesma estrada do já conhecido filme Efeito Borboleta mas a narrativa escorrega ao se jogar numa melancolia presa em um labirinto com pouco desenvolvimento.

O conflito amoroso se prende novamente no acaso com a chegada de um novo amor para a protagonista. É como se o roteiro dissesse de forma redundante que o looping vivido é uma certeza e que se algo precisa de solução é no passado. A busca por uma canção que falta não se sustenta em hipótese nenhuma. Seguindo essa estrada, o longa-metragem se desencontra com as reflexões plantadas no seu corrido arco inicial.  

Grandes Hits é uma história sobre recomeços, camuflada de acasos do amor que escancara o luto através do inusitado, absorvendo a ideia de que com a música pode voltar para qualquer lugar. Pode ser que você goste, eu achei bem mais ou menos!


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Crítica do filme: 'O Que Jennifer Fez?'


A sombria caminhada rumo à tragédia. Chegou na Netflix um documentário intrigante que mostra friamente a descoberta da maldade. Explorando os detalhes surpreendentes desse True Crime, O que Jennifer Fez expõe a psicopatia, as inconsequências de um crime violento, a descoberta da maldade. Ao longo de sombrios minutos vamos entendendo melhor essa história que apresenta reviravoltas e verdades impressionantes que giram em torno de uma família e seus segredos.

Uma jovem liga para a polícia relatando seu desespero em uma situação de invasão à própria casa e uma ação violenta contra os seus pais. A polícia da pacata cidade de Markham, Ontario, é acionada e logo uma ampla investigação é instaurada. Durante 15 dias, muitas possibilidades logo surgem, reviravoltas macabras acompanham o andamento dos fatos que tem como foco Jennifer Pan, uma jovem com mentiras no seu passado.

O que aconteceu naquela casa? Será que foi um plano frio e calculado? Um assalto aleatório à casa de uma família com raízes no Vietnã? As peças aos poucos vão ganhando seus lugares, deixando uma narrativa imersiva aos depoimentos gravados pela polícia, além de relatos dos investigadores envolvidos na tensa investigação. O documentário amplia o suspense sobre o caso, montando uma quebra-cabeça de nada fácil resolução.

Variáveis ligadas ao psicológico vão ganhando contornos assustadores. Tem o ex-namorado com a mente conturbada, um relacionamento obsessivo levado até as últimas consequências, as possibilidades bem altas de premeditação, um laço familiar perdido com o tempo e absorvido por falsas verdades que vem à tona. O que Jennifer Fez mostra os limites sendo ultrapassados, os valores jogados fora, o aparecimento de uma mente perigosa no lugar onde menos esperavam.


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11/04/2024

Crítica do filme: 'O Fabricante de Lágrimas'


A eterna fuga das variáveis incontroláveis que a vida coloca no caminho. Buscando traduzir em narrativa audiovisual um conto de fadas sensual que se tornou um dos livros de maior sucesso na Itália, o cineasta italiano Alessandro Genovesi tem a difícil missão de transformar em cinema uma obra com suas peculiaridades, de mais de 500 páginas, que explora um amor proibido e a repulsa a esse sentimento. O resultado é uma narrativa que paralisa sua criatividade no trivial, na receita de bolo de outras obras, nos levando para conflitos de uma piegas objeção ao amar com um desinteressante e mal explorado ar sombrio.

Na trama, conhecemos Nica (Caterina Ferioli, em seu primeiro trabalho no cinema), uma jovem com muitos traumas, orfã aos oito anos, que logo é enviada para um lar adotivo, o orfanato Sunny Creek, chefiado por uma insensível mulher que pratica abusos psicológicos com todos que chegam. Nesse mesmo lugar, está Rigel (Simone Baldasseroni), um introspectivo jovem que implica a todo instante com a recém chegada. A protagonista cresce, e já adolescente, é adotada por um casal que perdeu o filho tempos atrás. Para surpresa dela, Rigel também é adotado pela mesma família. Ao longo dessa nova jornada na vida dos jovens, um laço vai se criando e verdades do passado começam a serem descobertas.

Baseado no romance homônimo de Erin Doom (que também assina o roteiro), O Fabricante de Lágrimas estaciona em uma melancolia sonolenta, que busca nas emoções de seus protagonistas retratar um caótico conflito ligado à cicatrizes na alma. De forma nada profunda, escorregando nos clichês, esse romance adolescente não consegue ter uma narrativa eficiente, fruto de uma construção corrida que envolve traumas, dor, luto, tendo como foco Nica. Rigel é um mero coadjuvante, apenas contorna a trajetória de seu par romântico, uma pífia construção do personagem junto a uma desastrosa atuação de Simone Baldasseroni.

Um filme que poderia explorar, entre outras coisas, lidar com o perdoar de quem você ama. As variáveis realistas, situações e principalmente conflitos que podemos achar na realidade estavam todas ali. Algo que poderia gerar muito mais reflexões. Todas são mal aproveitadas. A maneira como demonstram os traumas, por exemplo, parece um jogo com peças faltando, lacunas não respondidas, tudo isso num ritmo corrido sem deixar interpretações para as emoções e alguns flashbacks que não dizem muita coisa. Se você parar para pensar e chegar até o filme Crepúsculo, não é nenhum absurdo, há semelhanças. E isso, não necessariamente, é uma coisa positiva.

O ar sombrio e sensual nas descobertas do amor buscam trazer um suspense que não se encaixa às generosas doses dramáticas que dominam os 103 minutos de projeção. A direção de arte nesse ponto até que acerta em alguns momentos, há um clima imposto nesse sentido para revelações. Muito pouco para convencer, os personagens mesmo dentro desse contexto não se tornam marcantes em nenhum momento e isso é como uma flecha irreversível no coração da narrativa.

Top 1 da Netflix em muitos países desde seu lançamento recente, e com canções das artistas mundialmente conhecidas, como: Olivia Rodrigo e Billie Eilish, em sua trilha sonora, esse longa-metragem italiano parte do luto, chega na fuga das variáveis incontroláveis ligadas ao amor e encontra a mesmice. Haja água com açúcar!

 

 

 

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Crítica do filme: 'Death Sentence'


Quando o caos é tudo que existe. Dirigido pelo excelente cineasta James Wan, conhecidos pelos filmes de terror do seu currículo, em 2008 chegou aos cinemas um filme de ação brutal com alta doses dramáticas que coloca em evidência uma imersão às consequências de uma vingança. Protagonizado por Kevin Bacon, Death Sentence é sobre o estopim de uma guerra, a destruição de uma família, e as tentativas em vão do equilíbrio de uma equação que não deveria existir.

Na trama, conhecemos Nick (Kevin Bacon) um homem bem sucedido, com uma família feliz. Tudo muda quando, após parar em uma loja de conveniência, seu filho é assassinado de forma brutal. Completamente desnorteado com o ocorrido, logo seu luto vira vingança e assim, sem medir as consequências de seus atos dá início a uma jornada sem volta.

A justiça existe? Causando reflexões nas linhas do ‘o que você faria?’, Death Sentence, de forma sangrenta e sombria, apresenta uma enorme desconstrução de um personagem completamente enfurecido, que se desprendeu dos valores morais para ir atrás da justiça que acredita. Essa confusão no ultrapassar limites entre o que é justiça e o que se encaixa como vingança é o campo mais amplo nesse projeto rodado em apenas dois meses.

O drama familiar ganha contornos profundos na narrativa quando pensamos na relação do pai com seus filhos. O preferido, ganha todos os olhares com o mais jovem ficando de lado. Essa relação conturbada entre pai e seu filho mais novo acaba ganhando muitos olhares. A habilidade de Wan em traçar conflitos emocionais ligados à família ficam em segundo plano mas vão além da superfície.

Inspirado na obra homônima, escrita pelo autor norte-americano Brian Garfield em meados da década de 70, Death Sentence é uma caminhada rumo as certezas do precipício, da não tentativa de se desprender do ‘Olho por olho, dente por dente’. Quando o caos é tudo que existe, a sentença já está assinada.  


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08/04/2024

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Crítica do filme: 'Igualada'


Eu sou porque somos. Exibido no Festival É Tudo verdade 2024, o documentário colombiano Igualada chega para mostrar algumas verdades do mundo político e as possibilidades de como a coragem aliada à uma forte corrente de mudanças buscam se libertar do medo, da intolerância. Partindo de um termo desdenhoso, referido à ativista social Francia Márquez, que logo acende uma chama para um caminho de uma candidatura à princípio sem apoio nenhum, o documentário acende uma luz no fim do túnel virando mais um símbolo de um movimento que ganhou força pelas redes sociais e também nas urnas colombianas.

Quem chora pelos mortos? Através de entrevistas, do relacionamento entre a protagonista e sua aldeia, a contextualização, mesmos nos curtos 70 minutos de projeção, é muito bem feita. Sem entrar em alguns detalhes, entendemos a raiz de um movimento de mudanças encabeçada pela candidatura de uma mulher, mãe, negra, que em sua vida esteve em direto convívio com a violência para todos os lados, massacres, a luta pela terra, vendo a cada dia as dificuldades se tornando regra. Num universo quase sem regras de uma região afastada dos grandes centros colombianos, surge a esperança.

O foco do documentário, é uma visão geral dos meses do envolvimento de Francia Márquez com sua candidatura à presidência do seu país. Num início de campanha sem apoio de partido político, com muitas dificuldades financeiras, seguindo em frente com voluntários fiéis ao movimento criado, ‘Sou porque somos’, percebemos um forte posicionamento para pautas ligadas às causas sociais, ao feminismo, ao meio ambiente. Esses fatores ganharam o mundo através das redes sociais, tornando Francia um fenômeno nas votações e conseguindo, dias próximos às nomeações oficiais, ser nomeada como vice-presidente na chapa do agora presidente colombiano Gustavo Petro nas eleições de 2022.

Mas esse caminho não deixou de ser doloroso, com o preconceito estando próximo em cada esquina. Seus comícios em palanques por toda a Colômbia vinham sempre com uma preocupação com sua segurança e um forte esquema de segurança que em alguns casos até interrompiam suas falas por conta de prováveis ameaças. Uma cena do documentário retrata esse último ponto. Mesmo assim nada parou Francia, na verdade toda a adversidade parece ter servido como combustível para o restante da árdua caminhada, equilibrando os problemas pessoais com as barreiras políticas impostas por muitos que não queriam a ver no poder.

Como todo bom documentário, que não apenas liga a câmera e espera o acaso ou pontos que se acha importantes acontecerem, há uma estrutura narrativa que consegue de forma simples e objetiva traçar um recorte amplo da vida da protagonista e deixar margens para reflexões de todos que acompanham sua caminhada rumo às tentativas (necessárias) de mudanças.

Dirigido pelo experiente documentarista Juan Mejía Botero, Igualada é a jornada emocionante de uma ativista social que virou um símbolo de um movimento que mudou o foco dos olhares de quem está no poder de um país que esteve durante anos no alto dos rankings de violência.


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